
Sou naturalmente exagerada na expressão do afeto. Tenho urgência em libertar o carinho acumulado há eras aqui dentro. Uma cisma, um chamado me impele a fazer soar os sentimentos. Às vezes, vejo esse pulsar como um desconhecido que habita em mim. Imprevisível e destemperado. Talvez um traidor, que me rende à devoção quase sagrada. Ou, quem sabe, a revelação da minha essência.
Afinal, qual seria o sentido da existência sem as paixões confessadas, cúmplices, complicadas? Mesmo percebendo os riscos de ser transparente e frágil como um cristal, o espírito de romance sempre fala mais alto. Serei aceita ou condenada.
Eu vejo passarinhos verdes. Ouço os sinos tocarem. A sua presença dispersa as minhas sombras: cintilo da cabeça aos pés. Ele me faz feliz. Feminina, fêmea, faceira. Dou ao meu amor tratamento de rei, bem como o papel principal em todas as minhas histórias. Eu o busco desde a eternidade e acreditava que ele estaria sempre comigo.
Mas ele foge. Nada é suficiente para que ele fique: os agrados, as flores do meu vestido, a poesia, sequer a minha mão quente no seu coração frio. Ainda que eu me desnude até a alma, não consigo atraí-lo. Ele parte sem dar explicações e me deixa partida. O mais amável dos verbos não permanece em meus versos: vira a página, muda de assunto. Definitivamente, entre nós não há rima.
Seria ele mesmo “desprovido, minha filha”, como dizia minha mãe? Esperei que ele viesse e me colocasse num pedestal mas isso não passou de ilusão de menina-mulher-maria.
Eu já não tenho mais tempo. O meu coração dá sinais de fadiga. Descompassado, dança sozinho as baladas dos anos oitenta. Cada canção lembra os anéis que se foram. A aflição enjoada, cruel, marca as batidas em golpes sem sentido.
Um orvalho tímido se reveza com torrentes que inundam o travesseiro. Entrego os pontos. Abandono a missão. Visto o luto que eu nunca quis.
-Amor, você venceu!











