Escalada Militar no Caribe: EUA e Venezuela em Rota de Colisão

Operações secretas, retórica de guerra e o risco de um novo conflito no continente americano

Por Edgar Lisboa, Portal Repórter Brasília

Ilustração (Edgar Lisboa com recursos de IA)

A tensão entre Estados Unidos e Venezuela atingiu, nas últimas semanas, o ponto mais alto desde o início do governo de Nicolás Maduro. Washington reforçou sua presença militar no Caribe, ampliou operações antinarcóticos e confirmou o envolvimento da CIA em ações secretas dentro do território venezuelano. Caracas, por sua vez, respondeu com mobilização de tropas, retórica nacionalista e apelos à ONU contra o que considera uma agressão à sua soberania.

Operações no Caribe e ações encobertas

O presidente Donald Trump admitiu recentemente ter autorizado operações da CIA dentro da Venezuela. Paralelamente, a Marinha e a Força Aérea norte-americanas intensificaram exercícios e ataques a embarcações na costa venezuelana, sob o pretexto de combater o narcotráfico.
Fontes militares confirmam o deslocamento de navios, aviões e tropas, além da presença de um submarino com capacidade nuclear próximo à região — movimento que reacende fantasmas da Guerra Fria no hemisfério.

Resposta venezuelana e a retórica da resistência

O governo de Nicolás Maduro qualificou as ações americanas como “agressões imperialistas”. Em resposta, ordenou manobras militares nas fronteiras e reforçou a segurança de instalações estratégicas, especialmente os complexos de extração e refino de petróleo, pilares da economia venezuelana.
“Estamos preparados para defender nossa pátria em qualquer circunstância”, declarou Maduro em cadeia nacional.

Sanções, acusações e o campo diplomático

Os EUA acusam o regime venezuelano de envolvimento com o narcotráfico e o rotulam como um “Estado narco-terrorista”. Washington ofereceu recompensas milionárias por informações que levem à prisão de Maduro e de membros de seu círculo próximo.
No plano diplomático, Caracas apresentou denúncia formal à ONU, pedindo que o Conselho de Segurança condene as ações norte-americanas.

O alerta da especialista: um passo da retórica ao confronto

Carolina Pedroso, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Reprodução/Redes Sociais)

Em entrevista ao Jornal da CBN, a professora Carolina Silva Pedroso, de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), avaliou que a escalada no Caribe é “a mais perigosa das últimas cinco décadas”.

“Estamos falando de deslocamentos de militares norte-americanos muito próximos da Venezuela, com armamentos pesados e inclusive um submarino com capacidade nuclear. O potencial de conflito é o mais alto dos últimos 50 anos na região”, alertou.

Para a professora, a saída do atual comandante do Comando Sul dos EUA em dezembro é outro sinal preocupante. “Em um contexto normal, não chamaria atenção, mas com a autorização de operações da CIA dentro da Venezuela, o quadro fica explosivo”, destacou.

Lições da história e o temor de uma nova intervenção

Segundo Carolina Pedroso, a história recente mostra que intervenções militares norte-americanas tendem a piorar o quadro político e humanitário dos países-alvo:

“Não se trata de defender Maduro, mas de reconhecer que toda intervenção dos EUA na América Latina produziu resultados piores do que a situação anterior. É um padrão histórico.”

Ela lembra que, mesmo dentro do governo americano, há divisões. “Nem todos os setores do Pentágono ou da diplomacia concordam com o aumento da tensão. Muitos conhecem bem a complexidade da região e sabem os riscos de um confronto aberto.”

O papel do Brasil: cautela e bastidores

Questionada sobre a postura brasileira, a professora destacou o tom prudente adotado pelo governo Lula.

“O Brasil tem sido extremamente cauteloso. Após as eleições venezuelanas de 2024, o Itamaraty passou a atuar de forma mais discreta, evitando se alinhar a qualquer lado. Há um trabalho de bastidor, silencioso, tentando reduzir tensões.”

O chanceler Mauro Vieira e o assessor especial Celso Amorim têm atuado para “descontaminar a agenda bilateral” com os Estados Unidos e preservar o diálogo com Caracas. Porém, a especialista lamenta o enfraquecimento dos mecanismos regionais:

“A Unasul e a Celac perderam força. Isso obriga o Brasil a atuar praticamente sozinho em um esforço diplomático que, em outros tempos, seria coletivo.”

A ONU e o impasse institucional

A Venezuela anunciou que denunciará os EUA no Conselho de Segurança da ONU. Para a professora Carolina Pedroso, a medida é mais simbólica do que prática:

“Os EUA têm poder de veto. Portanto, a denúncia não deve prosperar. Mas esse tipo de ação serve para projetar a pauta venezuelana e pressionar aliados como Rússia e China a se posicionarem.”

Ela explica que o Conselho de Segurança reflete as assimetrias do poder global:

“É um órgão criado há 80 anos que ainda funciona com base na lógica da Segunda Guerra. As potências que decidem são as mesmas de então.”

Cenários possíveis

A tensão no Caribe pode evoluir em várias direções:

  • Confronto limitado: ataques pontuais e ações clandestinas continuam, sem guerra declarada.
  • Escalada militar: uma operação dos EUA dentro da Venezuela pode provocar reação russa ou chinesa.
  • Pressão diplomática: mediação de países latino-americanos, com papel de destaque para o Brasil e o México.
  • Crise humanitária ampliada: caso o conflito se intensifique, o fluxo migratório venezuelano para países vizinhos, incluindo o Brasil, pode crescer.

Caribe volta ao centro da geopolítica

O Caribe, historicamente tratado como “quintal estratégico” de Washington, volta a ser palco de uma disputa global. Entre o discurso antinarcóticos dos Estados Unidos e a retórica soberanista da Venezuela, o risco real é o de transformar uma crise política em um conflito armado.
Enquanto isso, o Brasil observa, cauteloso, tentando manter a paz e evitar que o fogo cruzado da geopolítica atinja suas fronteiras e sua estabilidade regional.

Portal Repórter Brasília, Edgar Lisboa

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